O exercício da responsabilidade e da colegialidade

2° ENCONTRO INTERNACIONAL DOS RESPONSÁVEIS REGIONAIS
Roma, 24-29 de Janeiro de 2009


O exercício da responsabilidade e da colegialidade
Jan e Peter Ralton – Roma, 25 Janeiro 2009
 
 
Como Cristo nos pediu, “o que quiserdes que vos façam os homens, fazei-o também a eles” (Mt 7,12), assim nós somos chamados a desempenhar as nossas responsabilidades no Movimento de forma colegiada.
 
Em 1938, uns jovens casais pediram ao Padre Caffarel que lhes explicasse esta nova espiritualidade que tinham descoberto. Ele foi ter com o Cardeal, que lhe deu a responsabilidade de se debruçar sobre esse trabalho. Então, dirigiu-se aos casais e disse: “Não sei, mas procuremos juntos”. Para a altura, esta era uma abordagem radical à orientação num assunto espiritual.
 
A tradição nas Equipes de Nossa Senhora tem sido a partilha das responsabilidades. Na equipe de base, todos são sucessivamente casal responsável de equipe. Todas as decisões são tomadas tendo em conta a opinião da maioria. Todos os períodos de responsabilidade são limitados. Casais Responsáveis de Equipe 1 ano, Responsáveis de Setor 3, Responsáveis Regionais 4, Responsáveis de Província e de Super-região 5, e membros da ERI 6. O Pe. Caffarel era inflexível em que todas as responsabilidades fossem partilhadas. De fato, ele deixou o Movimento nas mãos dos seus sucessores algum tempo antes da sua morte.
 
No mundo de hoje as raízes da Colegialidade são vistas em três fontes principais, jurídica, eclesial e escritural. Estas são parte da nossa compreensão de como a responsabilidade deve funcionar.
 
Só em 1965, quando o documento A Responsabilidade nas Equipas de Nossa Senhora foi redigido, é que a ERI se referiu pela primeira vez a “colegialidade”. Em 2002, a ERI procurou aprofundar a sua prática à luz da experiência a nível internacional e regional. Para nós, isso foi muito importante para a nossa própria vida. A reunião do Colégio teve lugar em Melbourne, Austrália, a nossa cidade. Nós éramos os anfitriões da reunião, e era o nosso primeiro ano como Casal Super-Regional. A discussão sobre a colegialidade era nova relativamente ao trabalho dentro do Movimento. Deu grande profundidade à nossa compreensão de como devíamos abordar a nossa própria função de responsabilidade.
 
A Colegialidade é importante nas Equipes de Nossa Senhora, porque é mais do que um método de funcionamento: é um estado de espírito. Realça o discernimento que se faz quando se trabalha em conjunto para descobrir a vontade de Deus. Também sublinha o sentido do serviço em que todos nós assumimos os nossos papéis. Isto é evidente nas palavras de Cristo: “Quem entre vós quiser fazer-se grande seja o vosso servo” (Mt 20,26).
 
A unidade de uma comunidade de fé não se realiza em si mesma, mas em Cristo. Ela tem três aspectos:
 
1. Em relação à comunidade: “Eu sou a videira; vós, os ramos. Quem permanece em Mim e Eu nele, esse dá muito fruto, pois, sem Mim nada podeis fazer” (Jo 15,5). Somos interdependentes.
 
2. Em relação à construção do Reino: “Veja cada um como edifica, pois ninguém pode pôr um alicerce diferente do que já foi posto: Jesus Cristo” (1Cor 3,10-11). Ninguém detém a verdade toda.
 
3. Em relação à unidade, “esforçando-vos por manter a unidade do Espírito, mediante o vínculo da paz” (Ef 4,3). Um observador numa reunião do Colégio, ouvindo algumas das discussões acesas, perguntar-se-ia como é que conseguimos trabalhar juntos. É a determinação de fazer as coisas bem que nos move. É a compreensão disto que permite que diferenças de opinião nos mantenham unidos.
 
A Colegialidade tem de ter uma função profética. “Sabeis interpretar o aspecto do céu; mas, quanto aos sinais dos tempos, não sois capazes de os interpretar” (Mt 16,3). Interpretar os tempos é a função profética de todas as comunidades de fé. À medida que a compreensão muda, detectam-se circunstâncias novas, necessidades novas, oportunidades novas, desafios novos, e cabe à comunidade de fé apresentar, através da graça, novas maneiras de exercer e praticar a Colegialidade. É fácil ver que não podemos fazer isto individualmente.
 
A Colegialidade baseia-se nos princípios de:
  • Igualdade: os seus objetivos são as boas relações e as tomadas de decisões.
  • Transparência: os seus objetivos são abertura e responsabilidade e, quando exercida corretamente, desenvolve a confiança. A confiança é um bem raro no mundo dos negócios hoje, e uma área em que o Movimento deve ser visto como sendo diferente.
  • Discussão: reunir a experiência de todos os interessados.
  • Equilíbrio entre autoridade e responsabilidade. Isto corrige o desequilíbrio que pode surgir quando há monopólio da autoridade. Em todos os níveis tem que haver uma entidade responsável para exercer o discernimento, a transparência, a reflexão e a tomada de decisões.
Quando exercida corretamente, a Colegialidade dar-nos-á a todos um bom sistema para orientar as nossas reuniões. Isto é muito importante quando os responsáveis se reúnem para trabalhar juntos. Nestas ocasiões, pode haver tendência a que alguns membros deem instruções aos outros em vez de verem as suas próprias responsabilidades. Mesmo para além da reunião, uma abordagem colegial ao comunicar com outros constrói comunidade e permite que muito mais gente contribua para a saúde geral do Movimento. No entanto, será sempre importante rever e considerar a profundidade do conhecimento expresso.
 
 
DEFINIÇÃO DE COLEGIALIDADE
 
No documento A Responsabilidade nas Equipas de Nossa Senhora, a Colegialidade é definida como “o pôr em comum dos ‘dons’ diversificados e complementares que o Espírito concedeu a cada um, numa procura comum da verdade e num encontro mais profundo entre nós”. Saberão por experiência como instintivamente procuram encontrar pessoas com competências que vocês não têm para complementar as vossas próprias capacidades.
 
Nas nossas funções de responsabilidade, precisamos de trabalhar para desenvolver em nós mesmos um estado de espírito que implique:
 
Uma procura comum da verdade: trata-se de um esforço para compreender e realizar a vontade de Deus para o Movimento. Essa procura exige
  • Uma coleta de dados que supõe:
    • que nos expressemos com clareza e verdade;
    • que estejamos atentos às necessidades e às expectativas da equipe;
    • que percebamos que não temos a posse exclusiva da verdade;
    • que percebamos que a nossa força está nas nossas diferenças, e como o Movimento pode beneficiar-se delas;
    • que nos preocupemos só com a qualidade do nosso serviço e não com a procura de poder.
  • Um período de verdadeiro discernimento exige
    • que façamos uma avaliação exaustiva à luz da vocação e dos objetivos do Movimento, convencidos de que é Jesus Cristo quem nos reúne;
    • que haja um tempo adequado ao bom discernimento, um equilíbrio entre falar demasiado tempo e ser demasiado impulsivo.
    • Tornou-se prática comum para as equipes com responsabilidades partilhar em oração silenciosa sobre as suas vidas e a sua espiritualidade. Tomam consciência de que a missão tem de se basear na formação.
  • Uma busca de comunhão e consenso que cria
    • comunhão, não uniformidade; a comunhão, por sua vez, leva à missão;
    • pluralidade que dá lugar a alimentar a reciprocidade e a coordenação.
  • O estabelecimento da confiança:
    • colegialidade é diferente de democracia, na medida em que depende da harmonia;
    • a confiança depende da transparência; para esta ser efetiva, tem que funcionar em todos os níveis de responsabilidade dentro do Movimento. Foi por isso que desde o principio o Movimento instituiu os Casais Ligação. Todos nós somos, de fato, casais de ligação.
  • Um processo para assumir responsabilidades e tomar decisões:
    • Uma decisão deve ser o resultado de um processo de argumentação e contra-argumentação entre vários participantes, que, a dado momento, aceitam um ponto de vista ou uma  decisão que pode ser diferente da sua posição inicial. 
    • Trabalhar juntos para chegar a um consenso deve unir-nos, de forma a sentirmos que estivemos envolvidos no seu desenvolvimento. Estamos certos de que terão verificado como isto dá poder aos membros da vossa equipe.
  • A aceitação de decisões conjuntas sem reservas:
    • Se o princípio da discussão for respeitado, levará a acordo. O consenso é o resultado que se procura, mas a sua consecução não deve subjugar a discussão.
    • A limitação do consenso é que uma opinião poderia prevalecer sobre todas as outras. Há que perceber que não é possível que uma pessoa tenha razão e todas as outras não.
    • A discussão não confere a certeza, mas confere um elemento de seriedade e de atenção.
    • Deve ser levado a cabo de forma harmoniosa, colegial e precisa.
Uma vez tomadas as decisões, o exercício da responsabilidade tem que se basear num sentido de serviço e não na autoridade. Para se realizar no sentido pleno da Colegialidade, uma avaliação periódica garantirá que a decisão foi boa e de acordo com o espírito do Movimento.
 
 
RESPONSABILIDADE
 
Papel do Casal Responsável e oportunidades de responsabilidade:
  • No Movimento, todos os níveis da organização trabalham em forma de equipe. O casal responsável pode trabalhar no sentido de estimular a amizade e a confiança entre todos os membros. A partilha tem provado ser muito útil neste aspecto. A oração é também indispensável “pois, sem Mim, nada podeis fazer” (Jo 15,5).
  • Os responsáveis podem identificar e estimular dons particulares de cada membro da equipe e deixar que cada membro ponha as suas competências ao serviço do grupo.
  • Há oportunidade para estimular o trabalho de reflexão através do estudo e da discussão de vários assuntos de que a equipe trata.
  • Trabalhando com caridade fraterna sempre que há divergência de opiniões, o grupo avança até chegar a um consenso.
  • Quando não se consegue chegar a um consenso e a decisão final tem de ser tomada pelo Casal Responsável, este pode fazê-lo de coração e em consciência, apoiando-se na oração e no espírito de serviço.
Assim, a responsabilidade no âmbito da colegialidade não diminui o papel do casal responsável, e este continua a ser o sinal visível da unidade da equipe.
 
O mundo está cheio de sofrimento, mas também de felicidade. Devemos amadurecer através das responsabilidades que temos para que a civilização do amor que Jesus Cristo anunciou no seu Evangelho possa ser construída.
 
A Igreja e o nosso Movimento enfrentam hoje desafios imensos que testam a confiança e o entusiasmo dos que proclamam o Evangelho. Não são só os números que refletem o fato de os cristãos serem uma minoria, mas as mudanças culturais dominadas pela falta de compromisso.
 
A Colegialidade é uma das formas de envolver as novas gerações de jovens responsáveis que estão mais abertos e preparados para este método de trabalho. Desta forma, o chamamento do Senhor que receberão receber através de nós ajuda-los-á a crescer e ajudará outros a crescer em total e radical compromisso ao serviço do Evangelho.
 
Nós, Equipes de Nossa Senhora, vivemos a Vida de Equipe desde a primeira reunião, em 1939, à volta do Pe. Caffarel. Não será este o melhor testemunho dos frutos da colegialidade?